Para quem não me conhece bem, sou casada há 16 anos com o Bruno e tenho dois filhos: Gabriela de 11 e Gustavo de 8 anos.
O Guga nasceu com uma deficiência imunológica rara chamada Doença Granulomatosa Crônica (DGC). Explicando rapidamente, meu filho não tinha defesas para bactérias e fungos que para a maioria das pessoas seriam inofensivos.
Aos 38 dias de vida, o Gustavo foi internado com temperatura de 40ºC e com uma saliência no pescoço que lembrava caxumba. Permaneceu 30 dias na UTI até a descoberta da doença e enfim, a alta.
Saímos do hospital fragilizados, com medo do desconhecido e passamos a viver mais isolados das pessoas, imersos num mundo de álcool 70%, esterilizações constantes e menos contato com amigos e família.
Fizemos uma consulta com o médico que diagnosticou o Guga e saímos de lá num misto de tensão e hipnose.
Nosso filho tinha basicamente duas opções:
Tomar antibiótico de 12x12 horas e mais um tipo de vacina caríssima 3x por semana. Evitar chuva, pisar na grama, areia, contato com pessoas doentes, etc. E, como disse o médico, ter uma vida relativamente normal
Fazer um Transplante de medula óssea (TMO), que também teria duas chances: curá-lo ou matá-lo.
Nesse instante, eu e o Bruno nos olhamos e falamos quase simultaneamente que faríamos o transplante.
O pensamento foi: se há uma chance do nosso filho ter uma vida normal, é dessa chance que iremos atrás.
Ainda não tínhamos ideia do caminho que iríamos percorrer, nem das dificuldades que viriam, mas levantamos a cabeça e procuramos colocar um sorriso no rosto. Pedimos orações, rezas, energias positivas, imposições de mãos e tudo o que nossos familiares e amigos de todas as religiões poderiam fazer por nós.
Quando nos encontramos numa situação como essa não podemos negar qualquer ajuda. Precisamos ser humildes o suficiente para saber que não daremos conta do recado sozinhos. Com isso não estou dizendo para se vitimizar e achar que não dará conta de nada, muito pelo contrário, só estou dizendo que toda a ajuda é bem vinda.
A arrogância deve estar fora do seu dicionário, a paciência e a fé devem ser fortalecidas diariamente.
Outro ponto de extrema importância é que o casal deve se ajudar, amparar um ao outro. Há momentos que a balança pende para um lado e quem está mais forte deve amparar quem está em baixa.
Conheci muitos casais que se separam por conta dessas dificuldades. Não é fácil. A rotina muda, a vida fica mais complicada mas o amor deve prevalecer e ser cultivado ainda que os espinhos estejam por perto.
Voltando ao Guga, passamos a procurar um doador compatível e para a nossa sorte, a irmã dele, Gabriela, era 100% compatível.
Com 10 meses de vida o Gustavo foi submetido ao TMO. Dez dias de quimioterapia para “matar” a medula doente e preparar o corpo para a medula saudável.
Dia 23/01/2009 foi o dia “D”. Gabriela doou a medula ao irmão e eu passei a noite andando de um lado para o outro. Meus filhos estavam internados em extremos opostos do corredor daquele andar do hospital. O Bruno dormiu com o Guga e eu com a Gabi.
Minha filha morou 7 meses na casa da minha cunhada em Campinas enquanto eu, Bruno e Guga moramos boa parte do tempo em um hospital e outra num quitinete em São Paulo. Via minha filha poucas horas nos finais de semana.
Foram muitas idas e vindas de São Paulo para Campinas, algumas altas que duraram menos que dois dias até que as coisas foram voltando, vagarosamente, ao normal.
Hoje o acompanhamento é anual. O Guga foi o primeiro caso de cura dessa doença no Brasil, mas não é mais o único.
Tivemos a nosso favor: família unida e maravilhosa, doador compatível, médicos e enfermeiros presentes e muito otimismo para lidar com as adversidades.
Em meio a essa situação também lidávamos com a internação da avó do Bruno, a descoberta de um câncer de estômago no meu pai, uma hemorragia severa em uma tia-mãe que quase foi a óbito.
Não foi fácil. A vida é complicada, mas precisamos de um olhar mais simples para as coisas, devemos valorizar menos os bens materiais e mais a nossa saúde, as brincadeiras com as crianças, o sexo com quem amamos, a amizade sincera, a família.
Tudo é possível. As coisas acontecerão de qualquer maneira, querendo você ou não. Procure o melhor dentro do seu dia a dia.
Dia desses fui a uma festa de imunodeficientes em São Paulo e chorei ao ver a superação das crianças, adolescentes e adultos perante essas doenças que vem sem aviso.
Fui para dar testemunho da cura do meu filho mas o que testemunhei foi a força e a garra dessas pessoas que lutam para se manter vivos e com dignidade.
Vou partilhar um vídeo muito particular de minha família, que mostra um pouco da nossa experiência. As adversidades acontecem, mas não podemos deixar que elas escureçam nosso modo de ver a vida.
"Coloque mais cor nos seus dias e dê mais sorrisos às pessoas que te rodeiam."
Peço, para quem puder, que se cadastre como doador de medula óssea. Minha filha tinha 3 anos quando fez a doação. Eu faço parte do cadastro de doadores e espero ansiosa para que me chamem um dia. Abaixo link do video e das informações para doação de medula óssea.
Andréa Cristina Figueira